VALIE EXPORT
Genitalpanik!
Em 1969, VALIE EXPORT com os cabelos arrepiados e uma arma à tiracolo, expõe seu sexo para a visão dos espectadores de um cinema onde entrou. O uso do corpo como material artístico e a sua relação diante do espaço e da identidade são questões mais evidentes nos primeiros trabalhos de EXPORT.
O corpo é politizado de tal maneira que novos sentidos se revelam através de uma proposta onde a mulher não é mais objeto dominado pelos olhares dos homens, mais que pode e sabe retornar o olhar e mudar a situação de poder. Com esta inversão ela cria novos territórios para o cinema.
O corpo vai tornar-se ator da performance, da ação, do filme.
A artista austríaca trabalha os meios de comunicação e, mais particularmente, o fosso existente entre as representações midiáticas das mulheres e sua realidade social.
VALIE EXPORT, nunca foi ligada a uma interrogação puramente formal do material fílmico, mas sempre se preocupou com o conteúdo da imagem. A denúncia dos códigos e hábitos da sociedade machista é baseada em uma investigação e uso do filme, vídeo, performance, fotos. Mais tarde, ela incorporará o digital na sua paleta.
As obras que compõem a exposição em bcúbico propõem um passeio rápido no percurso da artista desde suas primeiras performances, ações, filmes e vídeos, mostra PING PONG (cortesia Generali Foundation Collection, Vienna), uma das primeiras obras de cinema expandido, e uma instalação dos anos 2000 em que revisita a questão do gênero a partir da filmagem dentro do seu corpo.
instalações
O Poder da Linguagem / Die Macht der Sprache
videoinstalação de 6 monitores com som.
Na última década, EXPORT criou um poderoso grupo de obras que se move dentro do corpo ao mesmo tempo que reflete a continuidade de suas preocupações anteriores.
Todas elas mostram imagem de uma glote, a parte mediana da laringe onde estão localizadas as pregas vocais, e enfocam o corpo como uma fonte de linguagem e discurso. Aqui, ela força o espectador a um confronto visceral com o discurso.
Embora a glote esteja ligada à habilidade da fala e da expressão de ideias e emoções, nas obras de EXPORT sua imagem também redefine o corpo e seu uso como material para a arte. As imagens dessa carne interna, atípica como tema artístico, evocam uma gama de associações, uma vez que a linguagem é um forte significante sob vários pontos de vista (fenomenologia, pós-modernismo, estruturalismo e pós-estruturalismo, psicanálise, teoria feminista etc.).
Olhando a parte interna em vez da parte externa do corpo, ela encontrou um meio alternativo de desconstruir imagens corpóreas predominantes. Essa visão interior invoca inevitavelmente associações eróticas, já que a glote normalmente, não identificável à primeira vista, apresenta uma forma carnuda um tanto semelhante à vagina.
Ping Pong,
Um Filme para Jogar — um Videogame
vídeo p&b mudo, projetor, monitor, mesa e raquete e bolas de ping pong; 2’30″, dimensões variáveis; baseado na videoinstalação homônima.
Pontos aparecem em vários locais da tela; o ator tem que tentar acertá-los usando uma raquete e uma bola de ping pong. Um filme para atuar — uma ficção (em alemão «spielen» significa jogar e «spielfilm» é um filme de ficção).
A relação entre espectador e tela só torna-se clara em termos semânticos: estímulo e reação. A estética do filme convencional é a da psicologia comportamental, seu modo de comunicação é um evento de percepção.
O filme explica a relação de dominação entre produtor (diretor, tela) e consumidor (espectador). Aqui, o que a visão leva ao cérebro desencadeia reflexões e reações motoras. Ping Pong revela reações ideológicas. Tela e espectador são parceiros num jogo com as regras ditadas pelo diretor do filme, na condição de que eles concordem com a transação. Neste sentido o consumidor reage ativamente. Nada mostra o personagem dominante da tela (meio de manipulação do diretor) melhor que isso: não importa o quanto o espectador intérprete um papel e jogue com a tela, nada muda, ou melhor, um pouco do seu status de consumidor muda.
A versão televisiva encaixa-se muito bem como exercício matinal. Pontos aparecem na televisão. O ator da TV em seu treino matinal joga ping pong com esses pontos.
vídeos em monitor ou projeção:
Touch Cinema / TAPP und TASTKINO
1968, expanded cinema, 2′ loop.
O documento de um minuto Touch Cinema chama a atenção para a famosa performance de rua de VALIE EXPORT, na qual o público era convidado a tocá-la dentro de uma caixa coberta com um pano, como se fosse um pequeno palco, e presa à parte superior do tronco da artista.
Um comentário espirituoso e confrontativo sobre a objetificação dos corpos femininos. Touch Cinema é um epítome das relações de poder entre os dois sexos.
Com Tapp und Tastkino,
a artista inverte o processo de consumo do filme na sala escura. O olhar do voyeur não está mais protegido pela escuridão, de maneira anônima para satisfazer seu prazer falsificado; ele está engajado em ter seu prazer de verdade, publicamente, diante do olhar do outro — que o examina —, mas também do público, que o vê fazer.
Um dispositivo de troca, de comunicação, se atualiza ao vivo.
Body Tape
1970, vídeo, 4′, p&b.
1: Tocar 2: encaixotar
3: Sentir 4: Ouvir
5: Provar 6: Empurrar
7: Andar
VALIE EXPORT explora a relação entre palavra e ação numa série de exercícios espirituosos, minimalistas que são introduzidos por intertítulos.
Texto Visual: Poema do Dedo / Sehtext: Fingergedicht
1973, vídeo-poema, 2′, p&b, mudo.
performance para a câmera na qual a artista se comunica com seus dedos, usa a linguagem de sinais como uma supressão de palavras e gestos.
O corpo como um transmissor de pensamentos.
VALIE escreve: «O corpo como um portador de informação, com e propósito de transmitir conteúdos tanto espirituais como físicos, é a imagem refletida da realidade interna/psicológica e externa/institucional.»
Texto respiração:
Poema de amor /
Hauchtext: Liebesgedicht
1970–1973,
vídeo-poema, 2′, p&b.
texto respiração é uma simples e poderosa performance, na qual VALIE EXPORT cria tensão respirando compulsivamente.
Body Politics
1974, vídeo-investigação, 3′, p&b, som.
A natureza da comunicação entre os sexos na nossa sociedade é predeterminada. As políticas comportamentais impostas pela sociedade para homens e mulheres podem ser demostradas de forma física. As escadas rolantes se movendo para baixo, demostram a existência de sistemas de comunicação em cinco fases separadas. Homens e mulheres estão conectados por uma corda amarrada em seus corpos. VALIE EXPORT
Ver Espaço e Ouvir Espaço / Raumsehen und Raumhören
1973–74, vídeo, 6’19”, p&b, som.
vídeo-performance simples na qual a artista, ao mesmo tempo em que se mantém em pé em um estúdio em total imobilidade, desloca-se no espaço e no tempo real por meio de múltiplas câmeras. O áudio é uma composição eletrônica original da própria artista. Ver um espaço e ouvir uma música. A obra é construída em trechos semelhantes aos de uma composição musical. O uso de múltiplas câmeras e técnicas dá a impressão de que a artista se move apesar de manter-se estática.
Adjungierte Dislokationen
1973, beta sp, 10′, p&b, mudo.
em Adjunct Dislocations, VALIE se transforma em uma entidade tecnologicamente avançada. Ela acopla câmeras 8mm no peito e nas costas, e transita por diferentes ambientes, movendo-se propositalmente de maneira errática, enquanto filma o que acontecia em sua frente e costas. Como resultado vemos a projeção de três filmes dessincronizados, que colocam simultaneamente o espectador dentro e fora do corpo de EXPORT, num espaço disjuntivo, invertido e desequilibrado.
I Turn my Pictures of my Voice in my Head
2009, vídeo, 12′, cor, som.
em um vídeo com a intenção de ser visto de fora a parte de dentro é transformada na de fora. A voz vem da laringe e é exposta de dentro pra fora. A voz tem de sair do abrigo; precisando de um equipamento para soar as coisas, para separar a voz de seu abrigo, a laringe, e sair. A voz é forçada a fazer algo, que de qualquer forma, gosta de fazer. O maior esforço: fazer algo permitido, mas intrinsecamente separado do mundo. Ela forja seu caminho antes de se perder totalmente. Isto foi um processo forçado com um equipamento.
Voz é sutura, voz é costura, voz é cortar, voz é romper, a voz é minha identidade, não é corpo ou espírito, língua ou imagem, é signo, signo das imagens, signo de sensualidade. É um signo de símbolos, é fronteira. Ela fala o corpo separado, escondido nas roupas do corpo, que está sempre em algum lugar. O sopro da vida é sua fonte. VALIE EXPORT: Segment from the spoken text.
documentação fotográfica
1. GenitalPanik 1969
Foto Peter Hassmann
© VALIE EXPORT
2. TAPP und TASTKINO
action (documentary photo)
3. Adjungierte Dislokationen, 1973
Experimentalfilm, Filminstallation, expanded cinema / experimental film, film installation, expanded cinema
© VALIE EXPORT
Set -Photo: Hermann Hendrich
4. BODY TAPE, 1970
Video, part 1: Touching
Uraufführung / premiered: Electric Cinema, Amsterdam, 1971
Videostill
© VALIE EXPORT
5. BODY TAPE, 1970
Video, part 5: Tasting
Uraufführung / premiered: Electric Cinema, Amsterdam, 1971
Videostill
© VALIE EXPORT
6. Raumsehen und Raumhören, 1973/74
Bild-Video, Zeitskulptur-Raumskulptur, Melodie / image-video, time/space-based sculpture, melody
Video, s/w, Uraufführung / premiered: „Kunst bleibt Kunst – Aspekte internationaler Kunst am Anfang der 70er Jahre, Projekt _74″, Kölnischer Kunstverein, Köln / Cologne, 1974
s/w Fotografie / b&w photograph
© VALIE EXPORT, Foto / photo: unbekannt / unknown
7. Sehtext: Fingergedicht, 1973
Video-Poem / video poem
s/w, ohne Ton, 2’16’’ / b&w, silent, 2’16’’
Uraufführung / premiered: The Austrian Exhibition, Demarco Gallery, Edinburgh, 1973
Videostill
8. Syntagma, 1983
Avantgarde-Film / avantgarde film
Videostill,
© VALIE EXPORT
9. Syntagma, 1983
Avantgarde-Film / avantgarde film
Videostill
© VALIE EXPORT,
10. Syntagma, 1983
Avantgarde-Film / avantgarde film
Kontaktabzug / contact sheet
© VALIE EXPORT
11. Syntagma, 1983
Avantgarde-Film / avantgarde film
Kontaktabzug / contact sheet
© VALIE EXPORT
Mostra de filmes em contexto:
…Remote…Remote…
1973, 16mm, 12 Min, cor, som
O ato de cortar a sua própria pele, ou seja, o cuidado estético bruto, a manicure, pertence aos códigos elementares da representação feminina. VALIE com um estilete prolonga este ato na duração. Insistentemente, passa do cuidado ao mau trato; fere-se, inflige aos dedos tratamentos sangrentos. Não apenas corta, mas insiste. A repetição dessas mutilações induz a percepção de uma dor para o público.
Mann & Frau & Animal
1970/1973, 16mm, 12 Min, p&b, som
Em Mann & Frau & Animal , EXPORT explora o percurso do prazer individual, solitário e auto-suficiente de uma mulher com um fim sangrento (estupro simbólico?) ao som de gemidos viris. A irrupção do sangue, a menstruação na imagem. Ao mesmo tempo, o prazer, o orgasmo e a menstruação. A afirmação do prazer feminino choca tanto o bom gosto quanto os hábitos dos homens, na medida em que já não se trata do prazer deles. O que fala, o que se mostra na imagem é o outro, a grande ausência. Essa fala, é antes de mais nada política.
Syntagma
1983, 16 mm, 18 Min, cor, som
Nessa época, a artista já tinha se transformado em um ícone da mídia, um objeto se assim quiserem. A abordagem de Syntagma é sobre o objetivo e o subjetivo, a autoconsciência e a percepção dos outros e pelos outros. Aqui, mais uma vez, há um pensamento autobiográfico por trás da obra, e novamente EXPORT utiliza a nudez intermitente como meio para salientar sua feminilidade, que é representada de várias formas; sua imagem sendo repetida, rimada, ecoada e dividida por telas separadas. EXPORT desenvolve, com o vídeo, dispositivos que unem, simultaneamente, vários pontos de vista que podem se encaixar uns nos outros para produzir um acontecimento específico.