mostrar o que não se vê — SU FRIEDRICH & o cinema
À sombra tutelar dos cineastas americanos, trabalhou na área do “documentário subjetivo”; Wharol, Mekas, ou seja artistas que documentaram micro-mundos, ambientes nos quais eles se identificavam, o cinema de Su Friedrich se desenvolveu privilegiando a fala, a escrita de um “eu”, se distanciando da celebração apenas em benefício de um posicionamento em relação ao mundo. Segundo Catherine Russel, mesmo se Warhol transforma seus amigos-atores em produtos, enquanto Mekas torna seus amigos cineastas em poetas de um novo mundo; aquilo que os motivava não era documentar os mundos, mas renovar as formas das representações cinematográficas, colocando em primeiro plano a experimentação formal e a expressão pessoal. Essas duas abordagens serão criticadas pelos cineastas que se afirmaram nos anos oitenta, entre os quais Trinh-Minh-há, Peggy Ahwesh, Su Friedrich, Abigail Child, Leslie Thornton, Pratibha Parmar, Isaac Julien, Marlon Riggs, Richard Fung, são as figuras mais importantes. A primeira vez que eu assisti um filme de Su Friedrich, em Londres, foi Gently Down the Stream de 1981. Esse filme curto me surpreendeu, ele parecia muito distante de tudo que então acontecia na França. Ele associava diferentes técnicas e conteúdos, usados com pouca frequência (poucos usitados) no cinema experimental da época, apesar do fato do cinema do corpo ser um cinema subjetivo, o filme focava mais na performance que na intimidade. Gently Down the Stream coloca a dimensão pessoal como prática política que torna do sonho um instrumento de análise de si mesmo e do social. A política dos corpos e dos gêneros, assim se manifestava através de uma série de sonhos gravada sobre a emulsão. Trata-se de uma seleção do seu diário de sonho. As imagens, acompanhando esses sonhos, não necessariamente ilustravam o conteúdo do sonho, a relação era menos sutil, menos tênue. Como escreve a cineasta, em um livro de artista que ela dedica a esse filme: “Quando a gente assiste ao filme, se leem os treze sonhos”. Os textos espalhados ritmam o filme, dando-lhe um aspecto tátil; eles ritmam e dão forma à imagem composta do filme, palavra por palavra, letra por letra, assinando, legendando, taxando as imagens fotográficas cujo elemento dominante é a água, imagem em movimento constituindo o segundo elemento da proposta. Os sonhos expõem os conflitos pessoais entre a política e a sociedade, frente à sexualidade, religião e feminismo. Esses temas são trabalhados ao longo da obra da cineasta. Quando Su Friedrich se lança, embarca, no cinema experimental, este está amplamente dominado pela produção masculina. Ela constitui o corpus majoritário do panteão da Antologia Film Archive nomeado The Essential Cinema, apesar da importância das obras de artistas norte americanas como as de Maya Deren, Shirley Clarke, Marie...
Chen Chieh Jen’s movies
Lingchi – Echoes of a Historical Photograph (2002) The concept for Lingchi – Echoes of a Historical Photograph comes from a photograph of lingchi torture taken in China by a French soldier in 1904 or 1905. Historically, there were three victims of lingchi torture who were photographed by different French soldiers. Their images not only served as testimony to savage barbarism in China, but were also made into postcards in Europe and widely circulated among novelty hunters drawn by their foreign, exotic appeal. In his 1961 book Les Larmes d’Éros, Georges Bataille discussed lingchi from a philosophical perspective, making it a widely recognized image among western intellectuals. Also, Bataille’s concern with ecstasy and limit experience made these concepts the most widely cited in discussions about lingchi in the West. With Linchi, Chen Chieh-jen extends his discussion of the history of photographed, which is concealed within the history of photography and is still unwritten. This video also references Bataille’s perspectives on ecstasy in eros to discuss the victim situated within a state of limit experience. Furthermore, Chen uses video technology to enter the body of the torture victim through two large wounds in his chest, where he shows us lingchi-like imagery from the modern history of China and Taiwan. Peering out from these wounds, the camera records portraits of historical western photographers and unemployed laborers in contemporary Taiwan. By way of these successive scenes, the victim’s body becomes a conduit linking the present to the past and serves as a metaphor for the invisible lingchi still present in processes of modernization of the non-western world. Chen believes the victim’s enigmatic smile as he gazes toward the horizon in the historical photograph not only reflects a state of ecstasy induced by opium, but more importantly creates confusion in viewers that begs for an explanation. As the victim endures lingchi, and is completely powerless to take any action or escape, he exhibits a subtle smile which he is able to preserve with the camera in the colonizing soldier’s hand. His smile becomes an act of dynamic defiance through the confusion it generates, and an image that continues to engage viewers in dialog long after the victim’s death. In this way, his smile is an action that cannot be erased by death or time. Using props, hairstyles and costumes that reflect different eras, as well as performances by unemployed workers and actors from small theater groups, the video Lingchi presents the continuing relationship between lingchi imagery and contemporary society. The Route (2006) Made for the 2006 Liverpool Biennial, Chen Chieh-jen’s video The Route is based on the historic Neptune Jade incident and...
filmes de viagem ENTRE TURISMO E COLONIALISMO
FILMES DE VIAGEM ENTRE TURISMO E COLONIALISMO Yann Beauvais O uso do cinema é inseparável de outros meios que apareceram ao mesmo tempo do seu nascimento. É que são dois meios de comunicação, ou mais precisamente, duas ferramentas que facilitam o deslocamento, que anulam a distância. O primeiro trabalha as imagens mentais, foi a psicanálise que abriu janelas para acender imagens, dificilmente acessíveis à nossa consciência, quando o outro é o avião que minimizou as distâncias entre lugares e aproxima os espaços. O cinema vai usar este dois paradigmas para elaborar, criar, novos espaços; novos tipos de representações. Se existe uma tradição de literatura de viagem, que se exemplifica nos livros de Joseph Conrad, o cinema vai rapidamente propôr novas alternativas para conquistar e impor novos modos de olhar e pensar o espaço, como as pessoas que vivem nesses espaços. O cinema é inseparável de uma reconquista geográfica do espaço que se ilustra através das múltiplas guerras coloniais que se têm registro, na forma de guerra civil ou de circuito turístico onde o estrangeiro, o exótico, são as manifestações da superioridade do homens branco sobre os nativos do mundo. Os irmãos Lumière vão mandar operadores para filmar e mostrar o que está acontecendo no mundo, evento ligado ao interesse pelo poder econômico e na sua vontade de expansão; se manifesta com a conquista de um novo imaginário que o cinema fornece. Quando o banqueiro e mecenas Albert Kahn decidiu viajar no inicio do século 20, e a partir de 1908, pediu para fotógrafos e cineastas fizessem retratos dos diferente aspectos, das particularidades e modos de vida e atividade humanas da época, . Esses profissionais foram recrutados e enviados pelo mundo inteiro a fim de fotografar em cores e filmar. As fotografias e os filmes constituíram o Arquivo do Planeta. Projeto prefigurando de vários anos, projeto do Getty Museum que hoje, na Califórnia, tentar monopolizar as fontes dessas imagens e representações do mundo. A Fundação Albert Kahn é ainda hoje uma fonte de pesquisa importante para encontrar os primeiros documentos em cores de vários lugares, como por exemplo as primeiras imagens em cores do Rio de Janeiro. As placas fotográficas, placas auto cromáticas, foram desenvolvidas pelo irmãos Lumière que fornecerem as películas para registrar as formas de vida antes que a modernidade acabasse com elas. O projeto participava de uma vontade de preservação (reter os vestígios de um passado que se decompõe em frente a modernidade) e também se inscreve em uma vontade de coleção, no sentido que era possível ver as maneiras de viver dos povos do mundo. De uma certa maneira, o projeto de...
PAUL SHARITS e o Cinema EXPANDIDO
Paul Sharits nasceu em 8 de Julho 1943 e morreu em 8 de Julho 1993. Paul Sharits é sobretudo conhecido como cineasta. Contudo, a sua prática não se limitou ao campo cinematográfico. A pintura, o desenho, a escultura e as performances têm uma forte presença, freqüentemente ignorada e no entanto essencial, se queremos compreender a amplitude e singularidade de seu trabalho artístico. Os seus trabalhos cinematográficos e pictóricos organizam-se segundo dois eixos: um formal, próximo do musical, participa do mundo da abstração, enquanto o outro estende-se ao campo psicológico e afetivo da figuração. Após estudar pintura na universidade de Denver, passa a dedicar-se ao cinema. O seu trabalho em cinema interroga a capacidade do suporte de produzir trabalhos que sejam anti-ilusionistas a partir dos elementos do dispositivo, ou seja: a fita e os fotogramas da fita, tanto quanto o desfile de fotogramas e por conseguinte a projeção, nos seus filmes de múltiplas telas, ou suas instalações.. Nos anos 60, Paul Sharits vai da pintura ao filme: “Parei de pintar em meados dos anos 60, mas tornei-me cada vez mais engajado com os filmes, tentando isolar e extrair a essência dos aspectos de sua representação [1]” Como diz ele mesmo, “A cinemática significa um tratamento cinemático de temas não-fílmicos; eu busquei interrogar os materiais e os processos do meu meio, de acordo com modalidades básicas como tema, e de acordo com princípios globais adequados.» Realiza então o filme que virá a ser, depois, Ray Gun Vírus, e que lhe tomará três anos. É nesse mesmo momento que encontra uma maneira original de escrever, desenhar as “partituras” de seus filmes e os desenhos modulares sobre papel quadriculado. Este sistema de notações sera liberado desta fonte, e fará com que retorne à pintura abstrata, inicialmente, e depois à pintura figurativa, a partir do fim dos anos 70. Fiz pintura abstrata e, ao mesmo tempo, filmes ‘normais’, com pessoas em paisagens. Era como uma dicotomia. Depois, parei de pintar e me interessei principalmente pelas artes que se relacionam com o tempo, assim como pela tipografia, ou seja, tudo o que tivesse a aspecto seqüencial; talvez por eu ter estudado música e amar música ou por gostar muito de cinema. Em determinado momento, comecei a desenvolver os elementos figurativos. O primeiro filme que realizei neste estilo, Ray Gun Virus, tinha em sua concepção inicial uma introdução figurativa, que acabei por eliminar. Eu passava por um estado de grande tensão emocional, talvez porque tivesse terminado a universidade e começasse uma nova etapa de vida, querendo eliminar de minha obra tudo o que fosse estranho a meus interesses. Já começara a experimentar, em breves estudos, as...
o expanded cinema de VALIE EXPORT
A posição de Valie EXPORT em relação ao cinema experimental e às artes plásticas é singular. Desde o início, ela escolheu trabalhar com cinema, mas não com qualquer tipo de cinema. Um cinema que ela chama de Expanded Cinema (cinema expandido). Conservaremos o nome inglês, pois se trata aí de uma compreensão do cinema, mais próxima da dos artistas plásticos dos anos 90; e radicalmente diferente da do cinema expandido dos cineastas experimentais do fim dos anos 60 e 70. Diferentemente da produção americana, dominada desde o fim dos anos 60 pelo cinema estrutural, mas também diferentemente da escola materialista europeia, encarnada pelo cinema britânico e alemão do início dos anos 70, Valie EXPORT privilegia mais o conteúdo do que a forma. Ela não tem uma dinâmica essencialista em relação ao cinema. Como ela mesma lembra, em uma entrevista de 1995: “Nunca fui ligada a uma interrogação puramente formal do material fílmico, mas sempre me preocupei com o conteúdo da imagem, isso sempre foi importante para mim” (1) Valie EXPORT conhece os trabalhos de Peter Kubelka, e os dos acionistas vienenses, tanto os filmes de Otto Mülh, de Gunther Brus quanto os realizados por Kurt Kren. Peter Kubelka interroga o cinema a partir de seu próprio material. Trata-se de um cinema formal, um cinema materialista que manifesta o suporte a partir de seu funcionamento segundo seus elementos constituintes. Ele trabalha por redução visando ao universalismo, prefigura o cinema estrutural em alguns anos. Define esse cinema como métrico. Essa crença no universalismo será invalidada por Valie EXPORT e pela maioria das artistas mulheres dos anos 60. A matéria-prima dos acionistas é o corpo em todas as suas expressões. Trata-se de uma insubordinação caracterizada que visa perturbar uma sociedade voltada para si mesma, fechada em um conservadorismo pós-fascista. Essas ações usavam e abusavam dos corpos. Utilizavam a mulher, a representavam, apesar de seu radicalismo reivindicado, como qualquer outro grupo, ou seja, ela era um objeto cujo único crédito era o de ser um dos elementos da performance, triturado pela instância dominante: o homem. Vemos como a prática de Valie EXPORT se singulariza em relação àqueles artistas. “Critico o papel das mulheres nas ações materiais realizadas por artistas masculinos (Como feminista, não me interesso pelos papéis dos homens).” Em suas performances, a ação “visa obter a união do ator e do material, da percepção e da ação, do sujeito e do objeto, o acionismo feminista procura transformar o objeto da história natural do homem, o material ‘mulher’, subjugado e mantido na escravidão pelo criador masculino, numa atriz e criadora independentes, ela é sujeito de sua própria história. Pois, sem a capacidade de...